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Imagem retirada de http://portalsegundaguerra.blogspot.pt
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Assim se passou o Verão. Em toda a Inglaterra se trabalhava febrilmente para enfrentar a invasão que parecia iminente. Os entendidos estudavam as marés e concluíam em que dia exacto ela ocorreria. Corria o boato de que um grupo de sabotadores desembarcara na costa Sul e que fora exterminado. Dizia-se, também, que uma frota de barcaças fora interceptada e afundada ao largo da Cornualha, que os hospitais em Paris estavam cheios de soldados alemães vítimas de terríveis queimaduras. A Luftwaffe iniciou com fúria os ataques à Inglaterra e, diariamente, eram bombardeadas cidades. O povo aprendeu a distinguir, pelo ruído dos motores, os aviões alemães e os ingleses. Houve lutas furiosas nos ares, e centenas de aviões inimigos foram abatidos. No fim de Setembro, os Alemães atacaram Londres. As docas foram bombardeadas, ruas inteiras de casas pobres no East End foram reduzidas a uma massa de escombros fumegantes; o Buckingham Palace foi atingido; Regent Street, Bond Street, Piccadilly; viam-se em Mayfair grandes buracos onde fora outrora uma velha mansão georgiana. Uma fábrica em Croydon foi bombardeada e morreram duas centenas de jovens. De vez em quando, uma bomba atingia um abrigo e poucos dos que ali se achavam conseguiam escapar. Os «raids» começavam ao escurecer e o sinal de «perigo passado» não soava antes dos alvores da madrugada. O povo de Londres passou noites terríveis, mas continuou a trabalhar e manteve a calma.
O país vivia
preocupado com os rumores correntes de que os «quinta-colunistas» andavam
activos; era notório que tais actividades muito haviam ajudado o inimigo nas
invasões da Polónia, Bélgica, Holanda e Noruega, e não era de crer que os
Alemães deixassem de empregar na Inglaterra os métodos que haviam dado tão bom
resultado em toda a parte. Corriam boatos terríveis e era geral a queixa contra
o governo, por não estar suficientemente cônscio do perigo. Por consequência,
os estrangeiros foram vigiados e muitos deles mandados para campos-prisões.
Correu então o boato de que haviam sido detidos sem critério, tanto os que eram
suspeitos como os que estavam acima de qualquer suspeita; os jornais da
esquerda mostravam-se violentos contra a falta de discriminação do governo. Mas
isto também fixava o assunto no interesse do público.
In «Antes do amanhecer», romance de William Somerset
Maugham (tradução de Moacir Werneck de Castro), colecção «Autores de Sempre»,
Livros do Brasil, Lisboa, [1990].
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