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retirada de http://www.notapositiva.com
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Os navios existem, e existe o teu
rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas
cidades,
partem no vento, regressam nos rios.
Na areia branca, onde o tempo
começa,
uma criança passa de costas para o
mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.
Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas
esquinas.
Amo-te... E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.
As palavras que te envio são
interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já
reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se
respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades
bombardeadas.
In «As palavras
interditas / Até amanhã» (poesia), de Eugénio de Andrade (com retrato de Carlos
Carneiro), Colecção «Obra de Eugénio de Andrade» (n.º 2), Fundação Eugénio de
Andrade (FEA), Porto, Maio de 2002 (13.ª edição).
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