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segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Excerto do romance «Lolita», de Vladimir Nabokov

Vladimir Nabokov – foto retirada de http://dianedooley.wordpress.com

Os trâmites do divórcio atrasaram a minha viagem, e a sombra de mais outra guerra mundial descera sobre o globo quando, depois de um Inverno de tédio e pneumonia em Portugal, cheguei finalmente aos Estados Unidos. Em Nova Iorque aceitei sem hesitar o calmo emprego que o destino me ofereceu: consistia principalmente em inventar e compor anúncios de perfumes. Agradou-me o carácter ligeiro e os aspectos pseudoliterários do trabalho, a que me dedicava quando não tinha nada melhor que fazer. Por outro lado, uma universidade de tempo de guerra, de Nova Iorque, instou comigo para que concluísse a minha história comparativa de literatura francesa para estudantes de língua inglesa. O primeiro volume ocupou-me uns dois anos, durante os quais raramente trabalhei menos de quinze horas por dia. Ao recordar esses dias, vejo-os ordenadamente divididos em ampla luz e sombra estreita: a luz pertencente ao conforto de efectuar pesquisas em bibliotecas palacianas; a sombra, aos meus angustiantes desejos e insónias, de que já falei o suficiente.

In «Lolita» (romance), de Vladimir Nabokov (traduzido por Fernanda Pinto Rodrigues e revisto por José António Almeida), Colecção “Biblioteca Visão” (n.º 23), ACJ – Abril/Controljornal/Edipresse, Linda-a-Velha, Julho de 2000 (edição conjunta da revista Visão).

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