Joaquim Namorado
(Foto encontrada
em voarforadaasa.blogspot.com)
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É com o poema Judas, embora nitidamente inferior, o
segundo momento significativo do itinerário adolescente de Joaquim Namorado.
Sob a roupagem torguiana, antevê-se a passagem da revolta subjectiva, cujos
termos e mitologia permaneceram invariáveis entre nós desde os fins do século
XIX e seu idealismo anarquista, para uma revolta de contornos mais concretos na
qual ela se despirá dos últimos resíduos dessa mitologia e passará de forma de
consciência acusada a consciência acusadora. O sentimento de injustiça e
em particular de uma injustiça social que se cobre com a respeitável máscara da
referência religiosa, embora sem expressão poética digna de registo,
apresenta-se já com Joaquim Namorado. Em nenhum outro poeta neo-realista –
salvo Álvaro Feijó – se entrevê com tanta nitidez o processo de contestação de
um mundo e uma sociedade como religado à falência objectiva desse mundo, em
particular a sua falência religiosa. Para quem suponha que o «neo-realismo» é
simples eco de uma ideologia alheia caída no céu português mercê de
circunstâncias fortuitas, esta juvenil Invenção
do Poeta (leia-se, invenção do poeta social
futuro...) é inexplicável. A sua forma, demasiado dependente da dos grandes
poetas contemporâneos, sem poder comparar-se-lhe, não contribui par emprestar a
um tal combate espiritual, moral e ideológico o relevo que se poderia esperar.
Mas isso não impede que o tomemos a sério e vejamos nele a representativa
«transmutação» de toda uma geração do círculo do «presencismo» para outra coisa
ainda indefinida que no último poema de Invenção
do Poeta se evoca como
a claridade
de um dia maior.
É já com a consciência
perfeita de se situar nesta «claridade de um dia maior» que o poeta publica
Aviso à Navegação (1941) na colecção «Novo Cancioneiro» de que constituirá uma
das obras mais típicas. País de navegadores por antonomásia pareceria que o tema
da navegação enquanto símbolo da
nossa experiência histórica e metafísica ou vital nos fosse habitual. Tal não é
o caso, o que prova sem dúvida que a mitologia navegadora é, sobretudo,
referência ideológica. Na poesia moderna, a navegação
como aventura da alma e do espírito (mais do que do corpo) é, na essência, obra
de Pessoa-Álvaro de Campos – cuja presença em Aviso à Navegação é fundamental. Sem as implicações metafísicas ou
ocultistas de Pessoa o mesmo tema havia encontrado na própria Presença, na poesia de Branquinho da Fonseca
ou em poetas afins um testamento admirável, a tal ponto que o tópico marítimo e viajante se tornará um dos mais vivos da poesia portuguesa
posterior.
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