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quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

«A par da “Fabrica” de Vesálio, a obra de Harvey tornava-se um marco basilar da ciência médica», escreve Fernando Namora

Imagem encontrada em http://textosciencia.blogspot.pt/
Harvey escolhe Francoforte, reputado centro editorial, para a publicação da sua obra, que veio a ser lançada, com súbito escândalo, pelo célebre editor Guilherme Fitzer, na Feira do Livro de 1628. Dá-lhe o título de Exercitatio anatómica de motu cordis et sanguinis in animalibus e dedica-a a Carlos I, que se interessar vivamente pelos seus trabalhos: «Vós, que sois a nova luz do nosso tempo e, na realidade, o seu verdadeiro coração; vós, príncipe cheio de virtude e de clemência, ao qual eu, com alegria, atribuo todas as bendições de que goza a Inglaterra e todo o bem-estar das nossas vidas, suplico-vos que aceiteis com a vossa usual generosidade este meu tratado sobre o coração.»
Embora Harvey proclame a circulação, tal como a descreve, uma verdade positiva, deixa perceber os seus receios e sublinha os melindres que teve de superar. No preâmbulo ao capítulo VIII, por exemplo, confidencia: «Mas o que fica por dizer é de natureza tão inaudita e tão nova, que, se o disser, não só desafio a inveja de uma minoria como tremo de pensar que talvez me acarrete a aversão da humanidade inteira, pois têm grande poder a força do hábito e a influência que o respeito pelos antigos e pelas doutrinas profundamente arreigadas exercem em todos os homens. Contudo, a sorte está lançada e confio no meu amor à verdade e na boa-fé inerente aos espíritos cultivados.» E mais adiante, depois de discorrer sobre a disposição e estrutura íntima das válvulas cardíacas: «Comecei a ponderar sobre a quantidade de sangue que se desloca de um sítio para o outro, e logo compreendi que era impossível que tal abundância de sangue pudesse ser produzida somente pelos produtos da digestão, pois nesse caso depressa as veias ficariam exaustas e as artérias rebentariam por não poderem conter a enorme quantidade de sangue que lhe chegava…»
A par da Fabrica de Vesálio, a obra de Harvey tornava-se um marco basilar da ciência médica. Ficava a saber-se que as funções orgânicas dependiam de um fluido circundante, servindo o intercâmbio entre os diferentes órgãos, uma via fluvial que ligasse os diferentes centros produtores de um vasto e complexo império, coordenando-os com surpreendente perfeição. (…)arvey tornoHarvey tornava-se um marco basilar da ciência médica.  

In «Deuses e Demónios da Medicina – biografias romanceadas» (primeiro volume), de Fernando Namora, Publicações Europa-América, Mem Martins, 1989 (7.ª edição).

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