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Vinha
periodicamente no fumarento comboio de Salamanca, que desde Barca d’Alva corria
com o Douro até ao Porto. Deveria ter Guerra Junqueiro a esperá-lo e as férias
em Espinho davam-lhe a companhia de Manuel Laranjeira. Visitava, em Coimbra,
Eugénio de Castro. Em Amarante hospedava-o o solar de Pascoaes. Prendeu-se de
amores por Portugal. António Ferro escrevia surpreendido, em 1933, no prefácio
do livro da República Espanhola que a parte portuguesa da biblioteca de Unamuno
era uma «capelinha», o «recanto mais enternecido» onde se podia ver «Oliveira
Martins, Junqueiro, Herculano, Eugénio de Castro, Pascoaes, Eça de Queirós,
Fialho, Camilo, Raul Proença, alguns livros de gente nova, um livro de Mário de
Sá-Carneiro com uma dedicatória exaltada, quatrocentos ou quinhentos volumes
onde correm o pensamento e a alma portuguesa».
A
sua larga correspondência com Pascoaes foi publicada sob o título Epistolário Ibérico. Mas a Casa-Museu de
Unamuno, em Salamanca, alberga ainda inúmera correspondência de intelectuais
portugueses, inclusive algumas pouco conhecidas cartas de Pessoa e Mário de
Sá-Carneiro.
Nenhum
estrangeiro como D. Miguel de Unamuno tocou tão afectuosa e compreensivelmente
o «feitio» português. O relato da Camélia do Bom Jesus de Braga, o texto do
Sabugal, retirado dum jornal da Guarda, o retrato de Buíça, o drama de
Laranjeira, ou a análise de As Sombras de Pascoaes, ou as almas do
purgatório ou a D. Constância de Eugénio de Castro são alguns dos nódulos de uma
pessoalíssima leitura de Portugal em crise, atacado pelo desencanto e mesmo
pelo suicídio na transição do século XIX. Juntam-se aos outros retratos da
Espanha, escritos por um autêntico peregrino de paisagens físicas e
espirituais. Fica-nos a imagem diversa e apaixonada da Ibéria atravessada pelo
passo decidido de Unamuno.
Por
tudo isto, custa-nos compreender os quase 80 anos que retardaram a tradução e a
edição portuguesa de Por Terras de
Portugal e da Espanha, uma obra a vários títulos fundamental.
In A Phala, n.o16, Outubro 1989
(texto recolhido na obra «Urzes»,
editada por Manuela Correia, com a chancela
de O Independente, em 2004)
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