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Nazaré, 15 de Julho de 1955 – Breve encontro
luso-brasileiro da poesia e da prosa. Um abraço lavado por este mar de
transparências castiças e apertado pelo mesmo vento que enlaça com nós
sentimentais os pinheiros da duna.
Não sei, mas há qualquer coisa de
sagrado num diálogo entre pessoas que falam a mesma língua em tons diferentes.
São misteriosas distâncias físicas e metafísicas que se aproximam e se entendem
logo, sejam quais forem as diversidades que testemunham, e guardando ambas a
graça irredutível. Numa palestra de irmãos de pátria, é inevitável certa
monotonia que o prévio acordo a respeito de alguns valores essenciais motiva:
num colóquio em que um dos parceiros se exprime num idioma estranho, a raiz dos
assuntos nunca se atinge, porque fica sempre de fora não sei que subtil essência
da verdade, que se recusa nas locuções alheias; mas quando os interlocutores usam
dum léxico comum, que se matizou em terras diferentes, desaparecem todos os
baixios ou desníveis de compreensão, e a conversa parece uma seara a crescer.
As duas partes como que se induzem mutuamente. Ressuscitam vocábulos sepultos
no cemitério dos dicionários, surgem expressões ou imagens já pressentidas mas
informuladas, ensina-se e aprende-se na simples maneira de oferecer um café ou
pedir um cigarro. Clarifica-se sobretudo nos recessos da alma o baço sentimento
de uma lei de irmandade no sangue das palavras – a lei da conservação do
espírito nas suas formas específicas de comunicação, por mais que as
circunstâncias o dividam pelas cinco partes do mundo.
In «Diário
(7.º volume)», de Miguel Torga, edição de autor, Coimbra, Abril de 1983 (3.ª
edição, revista).
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